sexta-feira, 27 de novembro de 2015

#meuamigosecreto

#Meuamigosecreto me dizia que a melhor pessoa pra eu perder a minha virgindade era ele, que a gente confiava um no outro, que a gente era amigo e que ele tinha um carinho enorme por mim. Eu ia me apaixonando por aquelas palavras e pelo jogo que fazia eu me sentir desejada. Logo eu, que tinha passado por um processo complicado na adolescência de ter sido sempre preterida, tinha me tornado o patinho feio que virou cisne e agora alguém me queria de um jeito mais profundo, mais especial. Mal sabia eu que o interesse dele e da maioria dos meninos por mim dali pra frente seria sempre um único: sexual.
A história era ainda mais complicada, porque uma grande amiga também era apaixonada por esse #amigosecreto e, claro, apesar de negar, ele também era apaixonado por ela, toda linda, toda pura, toda branquinha, moça de família. Eu, a neguinha cheia de fogo, era só para satisfazer o seu instinto as escondidas.
Eu sempre falava que nada poderia acontecer entre a gente por conta desse envolvimento entre ele e minha amiga, mas ele sempre me dizia que ela era passado, além de reforçar um ódio recheado de julgamentos machistas sobre ela. Então, aos poucos, fui cedendo, nunca dizendo pra ele e nem pra ninguém o que eu sentia, porque de alguma forma eu sabia qual era o meu lugar e a minha condição. Ainda fiz isso em diversos relacionamentos mais tarde.
Uns dias depois de uma primeira tentativa de sexo com ele, eu fui a uma festa e o vi desfilando de mãos dadas com outra garota, mais uma dessas que preenchem as exigências de “moça para namorar”. Chorei no meio da festa, bebi tudo que podia, encontrei um amigo dele e foi naquele dia, com esse sujeito, que perdi a minha virgindade em um motel barato qualquer.
Não me lembro até hoje de praticamente nada. Me senti péssima e acabei contando pra ele em um outro dia, foi quando ele me levou embora de sua casa e me tratou como se eu estivesse suja. A coisa só piorou depois daí, porque agora ele e os amigos tinham aval para me taxarem de biscate, de fácil e para ficarem me ridicularizando nos lugares. Eu me sentia cada vez mais perdida.
Quando enfim me libertei de tudo, ele começou a namorar a minha amiga. Eu tomei coragem e contei o que havia acontecido a ela. Um tempo depois ele apareceu, tentou fazer com que eu me sentisse culpada, que eu sentisse vergonha por ter traído uma amiga, que eu sentisse vergonha por ter exposto algo que era para ter ficado escondido, me julgou, me humilhou, fez com que eu me sentisse a pior pessoa do mundo.
A minha amiga também achou que eu fosse culpada, brigou comigo e eu fiquei sozinha. Todos os meus amigos passaram a achar que eu não era alguém confiável, até eu mesma passei a me ver assim e levei meses para desfazer esse pensamento na cabeça das pessoas e na minha própria cabeça.
Eu já superei tudo isso, eu já perdoei essa pessoa, apesar de provavelmente ele ainda se sentir isento de culpa em toda essa história, mas, mesmo assim, eu não queria ter feito esse relato, porque ainda me dói de alguma forma. Eu ainda fico tensa quando as pessoas tocam no assunto de virgindade, porque tudo isso volta a minha cabeça e eu nunca sei o que falar. Só que todas nós resolvemos juntas colocar essas coisas que doem pra fora de uma vez por todas, para que os caras se toquem, para que as meninas mais novas não passem por isso, para que as pessoas percebam como o machismo está impregnado em nós, para que repensemos a criação de nossos filhos, a educação das nossas crianças. E sim, histórias e comportamentos como esses se tratam de casos de machismo e não de um “rolo” como costumam chamar por aí. Viver em uma sociedade machista é achar que as mulheres são sempre culpadas. Culpadas por se relacionarem com quem bem entendem, culpadas por aceitarem abusos, culpadas por serem maltratadas.
As meninas além de ter uma relação distante com seus corpos e a sua sexualidade e terem, em sua maioria, péssimos inícios de vida sexual, passam por traumas durante a vida inteira com sua aparência e em situações que comprometem seu psicológico. Entram em relacionamentos abusivos e são violentadas de várias maneiras, enquanto os garotos seguem a vida sem ser dar conta disso.
A situação das meninas negras é ainda pior, porque enfrentamos dupla opressão, a do machismo e a do racismo, nós ainda somos vistas como a diversão casual, como o objeto sexual, como a cor do pecado, como a imagem do desejo que não deixa o homem em paz, como se a gente não tivesse nenhum tipo de sentimento, a gente é apenas carne e é a carne mais barata do mercado. Muitas vezes, desestabilizadas emocionalmente, a gente assume mesmo esse papel.

Que, no mínimo, antes de ficar bostejando sobre essa hashtag, parem para refletir como nós mulheres estamos cansadas de desde a infância sermos subjulgadas e abusadas, como nós estamos saturadas e que isso não se trata de uma onda, de uma moda, de uma loucura que viralizou, de distribuição gratuita de ódio (até porque de gratuito isso não tem nada). Somos uma nova geração de mulheres que resolveu cobrar isso por nós e por quem nunca teve voz. Que isso sirva pra pensarmos juntos em como podemos mudar essa situação.

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

A neguinha metida

Se tem uma coisa a que sempre vou ser forçadamente encaixada é ao famigerado rótulo de “neguinha metida”. Um rótulo que para a sociedade sempre cabe a alguém como eu. E por que?
Simples, estou fora do lugar que me cabe. Pense, onde estão a maioria das mulheres da sociedade? Ou melhor, onde estão a maioria das mulheres negras? Quais são seus cargos? Quais são suas formações? Quais são seus lugares em ambientes políticos? Qual a voz e  atuação das mulheres negras na nossa pátria amada?
Sem hipocrisia, podemos dizer, quando pensamos na figura da mulher negra em nossas mentes, qual é a primeira representação? A de uma mulher independente, letrada, atuando em algum cargo de poder ou a de uma mulher com poucas condições financeiras, mãe, ocupando cargos subalternos e que viveu com pouco ou nenhum acesso à educação? Posso responder, eu mesma, que sou uma mulher negra, por muitos anos a representação que vinha a minha mente era a última.
Simplesmente porque pra mim as mulheres negras não estavam em nenhum desses lugares em que as pessoas estão em destaque e são protagonistas: cargos de chefia, cargos políticos, jornais, livros, televisão, capas de revistas, a frente de grupos musicais, a frente de movimentos sociais. Eu tinha conhecimento de poucas ou nenhuma mulher negra transitando por esses espaços, e
 foi assim durante a vida toda. 
No meu caso, tive o privilégio de ter uma família que mesmo sem entender muito do que eu pretendia e insistentemente buscava conhecer, sobre meus livros, meus posicionamentos políticos, as músicas que eu ouvia, mesmo sem esse conhecimento, todos me apoiaram e se esforçaram para que eu tivesse acesso ao que tinha de melhor.
Eu estive numa escola particular no Ensino Médio e quantas meninas iguais a mim estavam lá? Duas? Em uma escola de 200 alunos… Eu era a única adolescente sem computador em casa, sem acesso a Internet, lembro que meus colegas me zombavam porque eu achava o máximo alguns tipos de redes sociais no laboratório da escola e hoje em dia quando me veem com uma desenvoltura escrita muito melhor do que a deles, provavelmente o que pensam é: "olha essa neguinha, que metida".
E aí cheguei à universidade pública, quantas mulheres negras estavam lá? Pouquíssimas. Quantas professoras negras eu tive? Nenhuma. Não acho que isso seja uma coincidência e fico intrigada com quem acha, ou é muita inocência ou muita desonestidade.
A faculdade de Letras me deu uma bagagem ótima, abriu meus horizontes e me auxiliou numa das coisas que mais gosto de fazer, escrever. Melhorei consideravelmente minhas habilidades na escrita. Escrevendo e lendo textos acadêmicos, conhecendo e destrinchando gêneros textuais, obviamente, hoje falo melhor e escrevo melhor do que antes. Não digo melhor, mas de uma forma diferente.

Nunca vou me esquecer quando no meio de uma discussão com a minha mãe, ela respondeu revoltada: “E NEM ADIANTA COMEÇAR A FALAR DIFÍCIL!” Fiquei indignada! Não achava que eu estava “falando difícil”, acontece que eu havia adquirido um letramento que minha própria família não dominava, e eu não fazer mais parte da forma de se expressar daqueles que me criaram acabou dando ainda mais margem para quê? Para que eu fosse a “neguinha metida”.
Independente da minha formação, seria considerada assim de qualquer forma. Qualquer preta que saia do que lhe foi condicionado, que é, mesmo sendo oprimida, calar e, mesmo com raiva, servir, já é vista com maus olhos.
A partir do conhecimento que adquiri, resolvi que iria escrever não só para mim, mas para outras pessoas, expressar minhas opiniões sobre as questões raciais e o machismo, coisas que cada vez me incomodavam mais e que faziam parte da minha vivência. Escrevi nas redes sociais e muitas pessoas, principalmente mulheres, gostaram do escrevi e refletiram com as minhas palavras, mas, ao mesmo tempo, muita gente só pensava: "O que essa menina quer? Ela se acha a dona da verdade com essas opiniões de merda? Quem ela pensa que é para expressar o que bem entende? Quem liga para o que ela pensa? Af! Que neguinha metida!"
Então, eu fui escrever crônicas com as mesmas temáticas no jornal da cidade e o leque de julgamento se abriu. Claramente ninguém pensa que talvez eu seja a primeira mulher negra de vinte e cinco anos expressando esse tipo de opinião no jornal de um município tão conservador. Não que isso me faça melhor que ninguém, mas se qualquer outra mulher nas mesmas condições que as minhas estivesse lá, sinceramente e independente de opiniões preconceituosas, eu me sentiria satisfeita.
No ambiente de trabalho também fica evidente pra mim a condição da mulher negra, em todos os lugares em que trabalhei, instituições com 50, 100, 200 funcionários, cinco ou três eram negros, duas ou uma, eram mulheres negras, a maioria em cargos subalternos.
Isso quer dizer que acho que estar em cargos subalternos não seja uma posição digna? Não, muito pelo contrário, foram nesses cargos que milhares de mulheres negras foram arrimo de família e criaram seus filhos com dignidade, eu mesma sou fruto disso. Só acho que já chega de estarmos somente lá. Passamos anos construindo e recebendo nada ou quantias mínimas como recompensa de nossos esforços. Hoje deveríamos não só construir, mas supervisionar, gerenciar. Precisamos de oportunidades iguais.
E isso quer dizer que os gestores das empresas são racistas? Talvez, mas geralmente mulheres negras não tem oportunidades de se qualificar para certos cargos e, então, acabam ocupando sempre os mesmos. Somos empregadas domésticas, faxineiras, babás. Estamos lá cuidando da casa de outras pessoas e mal frequentando as nossas, cuidando dos filhos dos outros e pouco participando da educação dos nossos. Somos socialmente, culturalmente e economicamente levadas a esses cargos e condições.
Muita gente não dá a mínima para essa situação, não reconhece os próprios privilégios e fala sobre o mito da meritocracia e um tal de esforço pessoal que só cabe na realidade do próprio umbigo. Só que mais engraçado que isso, é que tem quem se diga indignado com a situação do povo negro no Brasil e em especial das mulheres trabalhadoras negras, mas quando uma mulher negra ascende socialmente, são os primeiros a apontá-la e a chamá-la do que? De neguinha metida. A neguinha que esqueceu as raízes, que se acha muito esperta, que não representa, que ficou muito radical, que anda falando demais.
O talento da mulher negra é sempre olhado como coisa de segunda mão, assim como nossa própria existência, nosso talento é rebaixado. Sempre rola uma falsa benevolência e elogios forçados que disfarçam o ar de superioridade. Sempre que penso sobre isso me lembro de uma reflexão que li sobre um trecho de "Quarto de Despejo" em que Carolina Maria de Jesus escreveu:


Comecei a catar papel. Subi a rua de Tiradentes, cumprimentei as senhoras que conheço. A dona da tinturaria disse:
– Coitada! Ela é boazinha…
Fiquei repetindo no pensamento: “Ela é boazinha!”

Carolina Maria de Jesus, uma artista de talento imensurável e produção intensa, era grandiosa e inteligente, porém mulher, negra e periférica. Estas últimas condições a faziam sempre, independente do que fosse capaz em sua intimidade, ser olhada com aquele olhar de coitadismo... A necessidade de comentar "Ela é a boazinha", como se pra justificar sua miserável existência no mundo, demonstram qual é a visão que as pessoas tinham e ainda têm sobre a mulher negra. 
Quem entenderá nosso valor? Quem admitirá que somos capazes? Alguns até admitem, mas sempre arranjam uma desculpa, uma oportunidade que nos é dada, um mentor... Ainda nos surgem esses disfarces de Princesa Isabel. Ainda não podemos ser donas de nós mesmas.
Com isso, também me vem a cabeça uma reclamação recorrente de uma grande amiga, assim como Carolina Maria de Jesus, mulher, negra e periférica. Apesar do imenso talento dela, sempre a apresentavam e a tratavam com aquele esteriótipo de pessoa em situação fragilizada. Sempre a ofereciam ajudas financeiras, das quais muitas vezes ela nem havia solicitado, não pelo seu trabalho, mas porque, coitada, ela precisava. Isso a incomodava muito e incomoda a todas nós que temos que provar a todo momento o que realmente somos para o mundo e, ainda assim, sermos desvalorizadas. Porque nós podemos ser talentosas, mas nem tanto, podemos ser inteligentes, mas nem tanto, podemos ter a palavra, mas não sermos protagonistas.
No meu caso, o que percebo é que pode até ser que admitam que eu escrevo bem, mas eu me acho demais. Pode até ser que eu tenha opiniões contundentes, mas eu sou muito arrogante. Esses desenhos que eu faço… Hummm… Eu nem sei o que estou fazendo direito! Enfim, não pertenço a lugar nenhum, nem a cultura de rua, nem a cultura acadêmica, minha postura não me permite entrar em nenhum dos lugares, pra um sou demais, pro outro sou de menos, no final das contas eu só sou uma neguinha metida.
Quando falamos de cultura e arte, quantos nomes de mulheres negras estão nos clássicos da literatura brasileira? Nos nomes famosos de artistas visuais? Quantas são as negras artistas prestigiadas pelo grande público? Quais são os talentos artísticos das mulheres negras? Nós não as conhecemos e quando elas surgem nós a rechaçamos, porque elas estão em lugares em que nunca as quisemos. Mulher não sabe, mulher negra sabe menos ainda. 
O machismo não permite que a gente se imponha, o racismo não permite que a gente tenha conhecimento e autoestima para se impor, juntos são os maiores inimigos da mulher negra, que continua sem lugar na História.
Acho bonito a ideia de que paremos de falar de racismo e machismo e comecemos a falar de sentimentos, mas para isso a realidade precisa ser confrontada e discutida. A realidade destroça todos os dias os sentimentos de muitas mulheres negras.
Criei uma casca para não ser atingida quando me dizem ou me olham com o olhar de “neguinha metida”. Só que também me permito fraquejar, não sou obrigada a ser forte o tempo inteiro. Confesso que muitas vezes me autoboicoto, sinto que não sou capaz, acho que a qualquer momento vão descobrir que eu sou uma farsa. Só que sempre volto e percebo que eu preciso estar ali, preciso ser a referência que eu nunca tive pra outras meninas e preciso continuar buscando essas referências em textos, amizades, movimentos sociais, mídia, na minha própria arte, nos meus próprios desabafos. Resolvi lutar ao lado de várias neguinhas metidas por aí, e o que posso concluir é: nós vamos mudar a porra toda. Gostem eles ou não.

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Lembra quando sua mãe disse
Que nossa casa parecia de hippie
Quem me dera
Não achar que tenho que trabalhar
Nessas coisas com ponto pra marcar
E desapegar
De toda essa balela
Apesar de tudo
A gente ainda insiste em achar
Quando acorda pra trampar
Que uma vida melhor
Nos espera
Mas eu até entendo ela
Sua mãe falou foi dos incensos, dos vinis
E do nosso desapego
Com a vassoura
A gente nunca limpa essa casa
Não faz nada direito
E eu faço comida sem roupa
Você
Como eu
Desajeitado
Sempre está do lado
Pelado
Lavando a louça
Os documentários
Que assistimos
São necessários pra saber
Ou pelos menos tentar saber
O que viemos fazer
No mundo
Talvez seja meter
Porque  é isso que a gente sempre faz
No sofá
Depois que acaba de assistir tudo
E com toda calma e paciência
Na estante de livros
Ao lado de garrafas de cerveja vazias
O Buda observa mudo
Diferente dele e de você
Nunca consigo ficar calada
E a vida segue sossegada
A gente briga e ri por nada
Paz , amor e caos
Pros jovens casais
Com muito amor e nenhum puto

sábado, 26 de setembro de 2015

Representatividade


Sou filha de pai e mãe pretos
Mas foi só um deles que me ensinou
Do meu pai não lembro nem a cara
Foi minha mãe sozinha com a ajuda das minhas tias quem me criou
Tia Cleide alegria, Tia Claudete sabedoria, Tia Cleusa amor,
Minha mãe é quem eu quero ser
Mal sabia eu que a figura delas se tornaria pra mim um modo de viver
Pra ser mulher e preta como minha vó, Dona Ana
Nesse mundo tem que enfrentar tudo de frente e não correr
Elas pouco me ensinaram sobre as nossas raízes e o preconceito
Mas foi a partir de seus exemplos de luta que eu aprendi qual era o proceder
E ao longo da vida conheci mais mulheres negras em quem eu pude me inspirar
Eu nunca vou ter vergonha de falar em poesia ou prosa
Sobre aqueles que eu escolhi pra amar
E quantas coisas novas que com elas eu aprendi a enxergar
Pra conhecer as coroas das rainhas mais belas
Eu não precisei ir até  a Inglaterra
Foi só olhar para o topo da cabeça de Carol Damiá
Pra entender um pouco mais de fé e ancestralidade
Minha amiga-irmã Mayara me apresentou seus orixás
E pra completar
A vida me deu Tavinha
Que me mostrou a arte e a força do seu batucar
Mulheres revolucionárias me mostraram a resistência
Quando provaram que o lugar de mulher preta é onde ela quer estar
Por isso eu aplaudo as futuras doutouras e mestres da Academia
Janys, Emi, Gabriela e Leticia
O que eu aprendi com vocês, a vida inteira eu vou guardar
Mulheres negras também formam cidadãos e por meio da arte pintam o mundo com cores pretas
Tenho muito orgulho das camaradas professoras e artistas Claudia Tropicana, Bruna e Silvia Negra
E se vier com papo torto, essa mana não deixa passar
Ela sempre vai defender as mina preta
As Vilas são Boas mas a Fernanda é muita treta
Com ela são poucas, não tem meia ideia pra trocar
E para cuidar do homem, da sociedade e da mente
Com poesia, leis e silêncio prudente
Hendrix, Galdino e Souza, as Pamelas curam as cabeças doentes
Elas são de se admirar
Também aprendi que a boa vontade apesar de tudo ainda é qualidade
E foi Silane que veio pra me provar
Fernanda Moura e Jessica Black cuidam de nossas roupas,
Lala Kawase, exemplo de amizade, embeleza nossos olhos
Dandara cuida de nossas dores,
Ana Beatriz cultiva nossos sonhos
Sonhos de um futuro melhor
Cada mulher negra é um universo
E nenhum deles é menor
Quando as percebi foi como se um novo livro se abrisse diante do meu olhar
Enfim uma história que tinha personagens com quem eu podia me identificar
Nos meus toca-discos agora elas não param de tocar
Solto a Ivone Lara, Leci Brandão, Jovelina e a Marrom
Quando me dá vontade de sambar
Pra ouvir as minas rimando boto Negra Li, Preta Rara, Kamila CDD, Cris SNJ pra estralar
E tem mais Tássia Reis, Yzalú, Luana Hansen e Karol Conká
Sem contar as minas do underground e aquelas que eu esqueci de citar
Muita mulher preta talentosa, que fica até difícil de falar
E apesar do dólar tá cinco conto até pra gringa eu posso viajar
Lauryn Hill, Erykah Badu, Betty Davis e Nina Simone já tão no play
E suas vozes são de arrepiar
Sem contar as poesias poderosas
De Elisa Lucinda e Roberta Estrela D’Alva
As minas tem muita ideia pra trocar
Combatendo o racismo e o machismo
Representando quem elas tem que representar
Apesar de poucos conhecerem seus nomes
Apesar de ainda não estamparem a capa da Rolling Stone
Há muito tempo as mulheres pretas sustentam guerreiros em suas tetas
E ao mesmo tempo lutam pra melhorar
Dandara além de mulher de Zumbi foi grande líder da comunidade quilombola
Sua foto não esta dentro dos livros de História
Mas ela também foi uma grande guerreira
Assim como Angela Davis representou e muito
Sendo uma dos Pantheras Negras
E por onde elas passaram e passam, lutaram e lutam, militaram e militam, viveram e vivem, sobreviveram e sobrevivem
Todas elas me guiam
Todas elas me abrem não só janelas onde eu posso enxergar um mundo novo
Elas me abrem as portas
E doa a quem doer
Elas me deixam entrar, me achar e ser
s sabemos que nossa postura incomoda
Mas a a gente não sai da linha de frente
Pq representatividade importa!

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Princesa africana

Quando eu vi seus braços abertos
E seu corpo envolto por longas tranças
Seus movimentos suaves
Que pareciam com passos de dança
A sua voz doce
E seu sorriso irradiante
Como os de uma criança
Suas palavras que iluminavam quem estava diante de ti
Foi nesse momento
Ouvindo as suas poesias
Que eu pude sentir
Que a nossa energia ancestral era tão grande
Que a sua força de mulher de origem periférica e negra
Era contagiante
Foi apenas um instante
Pra eu me apaixonar
E quando você se aproximou de mim eu pude confirmar
Que era muito mais do que poderosa e bela
Quantas qualidade eu pude enxergar
Além de inteligente, ainda tinha humildade
A nossa amizade viraria irmandade
Ela era sensível a dor, sensível ao amor
Nada do que ela dizia era sem sinceridade
Se com palavras eu pudesse expressar o que eu sentia
Talvez meu sentimento fosse chamado de empatia
Que significa reconhecer-se no outro
Mas parece que ainda era muito pouco,
Essa palavra ainda não definia
De origem bantu, fui buscar a palavra certa em nossas raízes de negra mulher
E agora eu posso te dizer, Pâmela, minha princesa africana
Ubuntu
Isso significa que eu sou
Porque você é

domingo, 9 de agosto de 2015

Quando não é machismo

Tem gente que adora falar que agora virou moda essa coisa de ser feminista
Porque todo mundo pode protestar
Desde que esse todo mundo não seja uma mina
E a gente já sabe que desde a maçã e o Adão
O grande problema do homem de bem sempre foi a buceta
Mas por essas histórias eu nunca vi malandro nenhum levantando pra contestar a bíblia
E muito menos a igreja
Então deixa com a gente mesmo
Porque se a história é nossa
Deixa que nois escreve
As bruxa vão continuar falando e as fogueiras queimando
Desde Joana Darc a gente sente na pele
Mas agora a gente não vai sozinha
Nós estamos queimando em muitas
Mas queimando de febre
Porque se tem uma coisa que me deixa doente
São as coisas que eu aprendi desde que eu me entendo por gente
Quando eu penso nisso minha cabeça até ferve
Tanta coisa ruim que eu escuto e reproduzo desde que eu nasci
Sinceramente eu sinto até vergonha
E até hoje antes de agir eu paro pra refletir
Eu fico atenta antes de olhar pra qualquer mina como se ela fosse minha inimiga
Antes de diminuir outras mulheres e sempre desconfiar de melhores amigas
Antes de pensar que mulher que sofre violência doméstica gosta mesmo é de apanhar
Que mulher solteira é fracassada porque não arrumou nenhum homem pra casar
Que mina com roupa curta só é assediada porque não sabe se valorizar
Ainda bem que eu percebi a tempo que com esse meu pensamento
Nada ia mudar
O foda mesmo é abraçar essa causa
E além de tudo isso ainda ter as picuinha de macho ofendido pra aguentar
Eu finjo que não entendo
Mas eu sei muito bem porque nossa resistência
Tem gente que subestima
Dor de mulher eles tratam igual médico de postinho
Isso é virose, cura com um tapa e três aspirina
Eles sabem cobrar o Estado, a polícia, os racistas
Mas quando o B.O esbarra neles
Aí eles mandam abaixar o dedo e parar de se fazer de vítima
Com certeza nunca prestaram atenção em quem é que o machismo atira
Pode apostar que essa bala mata muito mais do que a mulher que eles pensam que tá na mira
Ela mata as irmãs, as tias, as sobrinhas, as filhas
Ela mata as negras, as brancas, as gordas, as magrelas
Ela mata toda mãe solteira da favela
Aquela que todo mundo costuma chamar de puta
Mas que cria sozinha os cinco filhos dela
Sem falar naquele outro rapaz que eu conheci numa história triste
Tava perdido e depois de tanto apanhar matou o próprio pai
E o discurso contra a mulher ainda persiste
A culpa caiu na mãe do menino por escolher viver com um homem violento e bêbado
Enquanto o machista alcoólatra virou até santo no dia do enterro
E esse machismo faz com que toda mulher se sinta culpada
Até na hora de denunciar
Desde a história mais grave até o fiu fiu
O melhor que a gente faz é se calar
Porque ai da gente levantar a voz e ainda querer se revoltar
No sarau de poesia, na internet, na delegacia
Tem sempre um cara com três pedras na mão pronto pra poder jogar
Eles falam: cês tem Lei Maria da Penha, tem delegacia, que mais que vocês quer?
Meus deus, será que eles sabem mesmo como mulher violentada é tratada na delegacia da mulher?
Sabe quando você toma um enquadro e é humilhado sem ter feito absolutamente nada?
Quando eles grita no teu ouvido: Deita no chão, filho da puta, senão cê vai tomar porrada!?
É desse jeito que eles falam quando ela senta pra falar
Depois de ser estuprada sabe quais são as perguntas que ela ainda tem que escutar?
“Cê fez o que pra esse cara? Com que roupa você tava?
Tem certeza que cê não queria? Cê tava bêbada!
Pode ir que teu corpo num tem nem marca!”
E eles ainda acham que a gente gosta!!!
Eles acham que a gente adora uns cara falando merda enquanto a gente tá indo trampar
“Ah, mas tem mina que gosta sim! E tem outras que também vem me cantar!”
Primeiro que a gente sabe muito bem que os cara acha que a gente é um pedaço de carne
Ninguém tá ali pra elogiar
Segundo que uma mina também pode querer ser seduzida
E isso não quer dizer que ela tá numa vitrine pra comprar
Terceiro que eu vou mandar o papo reto
Porque ninguém é mais otário e é o seguinte
Não adianta tentar apagar as atitudes machistas
Porque a gente sabe muito bem que dezenove não é vinte
Não é feio quando a elite vai falar de redução da maioridade e vem com papo que a lei só protege bandido?
Quando branco pra tirar o dele da reta fala que já sofreu racismo porque chamavam ele na escola de palmito?
É assim que vocês costumam tratar o feminismo!
Dizendo que tudo isso que a gente reclama
É só porque a gente quer ser melhor do que o homem
Que machismo não existe
E no final das contas todo ser humano é ignorante
Sinceramente, vocês vão me desculpar
É no mínimo desonesto comparar certas coisas e dizer que mulher não tem do que reclamar
Parece que só eu não entendi que é um sonho eu esperar reflexão de quem não para nem pra escutar
Tem gente que só entende certas coisas quando é conveniente e eu já cansei de explicar
E pode até ser utopia, mas mesmo assim eu acredito que esse mundo ainda vai mudar
Mesmo com os olhos cegos pro patriarcado e pro machismo
Mesmo com gente que reclama do sistema
Mas não enxerga todo mundo que ele esmaga
Porque a visão revolucionária só vai até o umbigo
E no final das contas toda luta contra a maioria é mesmo isso
Pouca gente ou quase ninguém vai somar
Só meia dúzia de cara vão assumir os privilégios e colaborar
E vão ser poucas minas também que vão estar dispostas
Porque pra ser feminista tem que ter disposição pra ouvir um caminhão de bosta
E infelizmente sempre conseguem transformar o oprimido em opressor
E até as mina se ilude nas ideia torta dos cara querendo ser professor
Porque é melhor assim
Só querer ensinar e não aprender é a melhor saída
Como eles mesmos dizem
A gente só quer cobrar dos outros e não assumir as nossas próprias dívidas
Pra algumas pessoas não interessa nem um pouco rever as atitudes machistas
Muito menos concordar com as preocupações fúteis de um bando de louca feminista
Porque no fundo a mulher que eles gostam mesmo é a mulher que não grita
A mulher que só aplaude as militâncias, mas que não milita
A mulher que aguenta toda a injustiça e violência de boca fechada e de cabeça erguida
Mas é pra essas cabeças pequenas mesmo que eu tenho uma má nóticia!
Os tempos mudaram e eu vou continuar sim o meu protesto em forma de rima
Porque os faladores falarão
As coisas infelizmente são como são
E  eu não ando muito otimista
Tem uns cara que até lêem Simone de Beauvoir
Só que na hora do vamo ver é hasta la vista
Eles sempre vão ter coragem de aplaudir os POW dos mano
Mas vão virar as costas pros PÁ das mina